Wilson gravava gols e entrevistas dos jogadores do Atlético; uma das fitas é da conquista de 1971
Quando Wilson Fernandez foi chamado para servir a pátria, durante a Segunda Guerra Mundial, não temia os exércitos do Eixo com seus ataques aéreos e invasões territoriais fulminantes. O maior medo que bateu à cabeça daquele futuro soldado foi ficar sem notícias de seu amor, o Clube Atlético Mineiro.
Wilson, descendente de portugueses com índios brasileiros, transformou o Atlético em seu oxigênio. Conheceu Maria José, uma descendente de italianos em Belo Horizonte e driblou a natureza ao fazê-la atleticana e não palestrina.
A ligação do Galo era alimentada em presenças constantes nos jogos do clube e fortalecida através de um acervo particular sobre aquele time pintado em preto e branco. Recentemente, Wilson, que faleceu em 2015, deixou o legado para o neto Eduardo Rodriguez.
No processo de organização da herança do velho Wilson, Eduardo se deparou com a primeira moeda de ouro do tesouro: uma fita cassete com um áudio-documentário da Rádio Itatiaia sobre o título brasileiro de 1971.
Se o Galo completa 108 anos nesta sexta-feira (25), a primeira grande conquista oficial do clube celebrará 45 anos em dezembro.
A fita reproduzida abaixo é apenas uma das inúmeras horas de gravação que Wilson deixou na Terra. Depois de se afastar das arquibancadas por conta do aumento da violência, ele transformou o rádio na fonte de amor ao Galo.
"Meu avô levava a família inteira para o Mineirão. Mas começou a surgir as torcidas organizadas. E teve uma briga na arquibancada, e ele com a mulher e os oito filhos. De repente, voou bambu para todo lado e atingiu um tio meu. Nesse episódio ele se afastou do estádio. Virou uma época realmente violenta. Década de 1990. E ele ficou traumatizado naquela confusão. O rádio, então, virou a paixão dele. Tenho várias fitas em casa que ele deixava gravando os gols e as entrevistas do Atlético. Eu continuei com isso até o Willy Gonser parar (o locutor da Rádio Itatiaia aposentou em 2009)".
Além de catalogar as fitas, agora Eduardo tem a missão de achar outra joia do avô, um caderno que foi passado de geração e geração com anotações de todos os jogadores que foram comprados, vendidos e emprestados pelo clube alvinegro.
"Tinha um negócio interessante que era um caderno. Preciso achar ele porque sumiu nas minhas mudanças de endereço. Meu avô anotava toda contratação do Galo neste caderno, seja venda ou empréstimo de jogador ou compra. Fazia a ficha técnica desses atletas. Isso na juventude dele. Hoje estou com 35 anos e quando tinha 8 anos, lembro do meu avô na mesa da empresa de artesanato dele. Ele sempre anotava o caderno após o expediente. Dia de pagamento, ele terminava de acertar com os funcionários e depois me chamava para fazer o que mais gostava, que era atualizar o caderno", conta Eduardo.
Wilson Fernandez começou a ter complicações de saúde em 2009. A família sabia que o fim estava próximo. Mas ele não poderia deixar o Galo sem testemunhar um novo título de expressão. Depois de sobreviver, juntamente com o clube, à ameaças de rebaixamento, veio a consagração da Libertadores em 2013.
Wilson poderia ir em paz. Mas as forças o deixaram assistir ao título da Copa do Brasil de 2014. Já estava ótimo. Eduardo até pediu para o velho avô aguentar mais um pouco, afinal, faltava conquistar um Mundial, oportunidade desperdiçada em 2013. A resposta foi como um adeus confortador:
"Eu já vi o Atlético campeão do Gelo", disse Wilson, que se foi aos 98 anos para torcer pelo Atlético nas nuvens.
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